STF valida acordos coletivos que restringem direitos trabalhistas
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que normas de acordos e convenções coletivas podem limitar ou restringir direitos trabalhistas. Há exceção somente em relação ao que está assegurado pela Constituição Federal. A decisão foi proferida, ontem, em repercussão geral e terá de ser replicada, portanto, por todas as instâncias do Judiciário.
Existem, atualmente, 66 mil processos sobre o tema em todo o país. Essas ações estavam suspensas desde 2019 aguardando uma definição da Corte. Agora, voltarão a tramitar normalmente e terão o mesmo desfecho do caso julgado no STF.
O litígio analisado pelos ministros é anterior à reforma trabalhista (Lei nº 13.467/2017). Com a alteração da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), há cinco anos, passou-se a prever expressamente que convenções e acordos coletivos de trabalho têm prevalência sobre a lei em determinadas situações.
O processo julgado pelos ministros tratava das chamadas “horas in itinere” (horas de deslocamento). Eles analisaram uma cláusula do acordo firmado entre empresa e sindicato que previu o fornecimento de transporte para o deslocamento dos empregados até o local de trabalho, mas suprimiu o pagamento referente ao tempo de percurso (RE 1121633).
A Mineração Serra Grande, empresa envolvida no caso, vinha de derrotas no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de Goiás e no Tribunal Superior do Trabalho (TST). Desembargadores e ministros haviam considerado a cláusula nula.
Conseguiu virar no STF. O placar fechou em sete a dois para validar a cláusula e fixar a tese que dá força às negociações coletivas. Prevaleceu, nesse caso, o voto do relator, ministro Gilmar Mendes. Ele citou decisões anteriores em que a Corte se posicionou pela prevalência do “negociado sobre o legislado”.
Gilmar Mendes disse, além disso, que a Justiça do Trabalho interpreta esses casos com base no princípio protecionista — conferido em decorrência da hipossuficiência do empregado. Só que quando se trata de negociação coletiva, com interferência do sindicato, afirmou, há paridade de forças e deve-se aplicar o princípio da equivalência.
Frisou ainda, ao votar, que os acordos são feitos de concessões mútuas e, por esse motivo, não se pode examinar uma cláusula de forma individual.
“A anulação de acordos na parte que supostamente interessa o empregador leva a um claro desestímulo à negociação coletiva, que deveria ser valorizada e respeitada, especialmente em momento de crise. Recordamos aqui fatos ocorridos no contexto da pandemia. Vimos negociações entre trabalhadores e empregadores para manter os empregos.”
O entendimento de Gilmar Mendes foi acompanhado pelos ministros André Mendonça, Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso.
“O negociado prevalece sobre o legislado desde que não se esteja violando o patamar mínimo previsto na Constituição Federal”, enfatizou o ministro Barroso ao proferir o seu voto, em acordo com o relator.
Os ministros Rosa Weber e Edson Fachin discordaram. “Medidas flexibilizadoras implicam desfazimento do sistema constitucional de garantias trabalhistas e o esvaziamento das convenções coletivas”, ponderou Fachin. Para ele, ainda, as chamadas “horas in itinere” devem ser consideradas como horas extras, que estão previstas na Constituição.
Os dois ministros ficaram vencidos. A tese fixada estabelece que “são constitucionais os acordos e convenções coletivas que ao considerarem a adequação setorial negociada pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas independentemente da explicitação de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis”.